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segunda-feira, 23 de junho de 2014

Algures entre Abril e Maio


Passaram 40 anos de democracia num ápice vertiginoso. Portugal e o Concelho de Caminha conheceram o seu maior desenvolvimento do século XX. As comemorações da entrada na meia-idade da nossa democracia foram sóbrias, formais e pouco festivas. Sinal dos tempos de crise que vivemos em que os ideais de Abril parecem ter expirado em Maio.

Há quarenta anos atrás, na sequência do 25 de Abril, o país viveu o primeiro de Maio mais efusivo da história lusa. Momento irrepetível de camaradagem, fraternidade e solidariedade na exaltação da nobreza do trabalhador.

O 25 de Abril propôs ao povo português uma mobilização nacional no sentido de combater as maleitas de um país amordaçado por quatro décadas de fascismo. Esta mudança assentou num processo conhecido pelo célebre programa dos 3 D’s: Democratizar, Descolonizar e Desenvolver.

Efetivamente, o país democratizou-se e vivemos hoje num Estado de Direito democrático porque assenta na vontade popular e no respeito do pluralismo. Um Estado democrático porque é de Direito, resolve os seus antagonismos de acordo com o Direito, em respeito pela dignidade da pessoa humana e pelas regras da ponderação, da adequação e da proporcionalidade.

Na verdade, o nosso país cresceu em todos os setores: da economia às finanças, da integração das mulheres na sociedade (emprego, política, empresa), no combate à exclusão social, na proteção ambiental… Mas infelizmente, a diferença entre ricos e pobres continua longe dos nossos parceiros europeus.

A democracia, apesar das suas imperfeições e insuficiências, está definitivamente consolidada no subconsciente coletivo, embora haja sinais de que não tenha sido ainda integralmente assimilada pelas elites políticas e económicas.

Esses sinais estão bem patentes em setores como a justiça (em que o povo assiste incrédulo à inoperância do sistema face aos poderosos e a acutilância para com os pobres); na educação, com a destruição da escola e o desmantelamento da profissão do professor; na saúde, onde o sistema nacional de saúde, uma das grandes conquistas de Abril, está em fase de decapitação; o trabalho, agora desvalorizado e usado como arma de arremesso contra a dignidade da pessoa humana que vê o seu salário desvalorizado e vive na insegurança de um amanhã cada vez mais triste e sem esperança.

A atividade política criou também o seu artifício linguístico, agora já não existe um controlo da comunicação através da censura mas antes através das técnicas do marketing político. Assim, “despedir” é substituído por “reformar”; “baixar salário” passa a dizer-se “ajustamento salarial”; “aumentar impostos” será antes uma “contribuição solidária”…

Um dos perigos da democracia atual é a descrença e desconfiança que o povo manifesta em relação aos políticos que, em democracia foram eleitos para representar a sua vontade mas que claudicam perante o poder do capital, da finança e do interesse pessoal.


Nesta matéria, parece que os cravos que floriram em Abril murcharam em Maio. Por isso, é cada vez mais importante uma sociedade ativa, militante e intransigente na defesa dos ideais de Abril para que, na realidade, a Revolução triunfe.

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